segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

JAIMITE

Jaime Neves promovido a general e considerado herói nacional? E onde pára o pudor e a vergonha? Em qualquer país verdadeiramen-te democrático Jaime Neves já teria sido julgado pelo seu envolvi-mento em massacres durante a guerra colonial.

35 anos depois e a verdadeira história da guerra colonial continua por fazer, de tal maneira que se tentam enterrar bem fundo factos que nos deviam envergonhar e pelos quais já devíamos ter pedido perdão.

Que o digam os povos de Wiryamu, Chawola e Juwau todos eles em Moçambique barbaramente massacrados e onde Jaime Neves que então chefiava os Comandos teve papel de destaque.

Pela dimensão e impacto na altura destaco Wiryamu, onde centenas de pessoas, entre elas mulheres grávidas e crianças, foram chacinadas e incendiadas vivas dentro das suas palhotas, corria o mês de Dezembro de 1972.

A tragédia ganha nova dimensão quando em época de celebração de Abril se resolve premiar um dos seus altos responsáveis e promovê-lo a general precisamente pelo seu passado militar.

Em Dezembro de 1972 estava próximo do local da tragédia e senti revolta e vergonha por fazer parte de um exército que se conduzia de tal maneira. Para piorar a situação ainda tive que conhecer pessoalmente a besta humana que dá pelo nome de Jaime Neves, que ainda hoje é contra a independência das ex-colónias...

Não é segredo para os visitantes deste blogue que defendo que todos os criminosos de guerra e dos direitos humanos devem ser julgados independentemente da sua idade, cargo político ou militar. Mário Crespo tira-me do sério porque já é a segunda vez em poucos dias que faz o elogio de Jaime Neves, precisamente porque não pode ele ignorar estes factos porque há época também cumpria serviço militar em Moçambique. Seria preciso ser muito distraído para não se aperceber deles, embora na época o seu cuidado principal fosse acompanhar jornalisticamente Kaulza de Arriaga.

Não se me apaga da memória aquela mulher grávida ferida a tiro pelos homens de Jaime Neves, entre Vila Gouveia e o Guru, e que em boa hora o padre Faria obrigou o "Trinta" a descer o héli e recolhê-la. No chão ficaram dezenas de corpos de inocentes que o único crime que cometeram foi estar no caminho das tropas de Jaime Neves.

Mas estes factos foram riscados do livro oficial da história da guerra em terras de Moçambique. O poder actual age como se já não existissem testemunhas desse período. Mas muitos ainda continuamos vivos para repor a verdade de muitos factos tão vilmente escamoteados. Haja vergonha!

Para quem quiser conhecer melhor o que aconteceu em Wiryamu, pode fazê-lo aqui através de discurso directo do homem que na altura comandava a 6ª Companhia de Comandos, o alferes Antonino Melo, do qual vos deixo dois pequeníssimos excertos:

"...Caprichava-se na escolha da morte. As mulheres eram usadas sem pudor. Os homens caíam à paulada, pisados, outros a tiro. Um soldado de Tete matava as crianças à faca. Atirava-as ao ar como a uma bola de trapos e acabava com as suas graças na ponta da lâmina. Os que tentaram fugir foram abatidos a tiro. Também juntaram homens e mulheres em filas, colocaram-se em cunha, e berravam: «Batam palmas para se despedirem da vida.» De seguida, disparavam. Os corpos que caíam produziam um barulho surdo. Depois cobriam-nos com mato e lançavam o fósforo. As crianças pareciam línguas de fogo entre o fumo."

"...Metiam dez, talvez quinze pessoas, numa palhota, é difícil precisar neste momento. Foi tudo muito a correr, mas quando ficava cheia, lançavam as granadas e fechavam a porta. Passavam uns segundos. Antonino primeiro ouvia os gritos desesperados, silêncio quando as granadas rebentavam, o tecto subia, caía, a palhota incendiava-se. De novo gritos, choro. Poupava-se balas. Morriam queimados. Às vezes, a porta abria-se, alguém tentava fugir. Tiros. «Nestas operações, matar um ou vinte é indiferente. Depois de desencadeada, é para cumprir e seguir em frente. Tudo a eito.» A mesma expressão neutra."...

Assim se faz um herói...




sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

50 Anos


"Os miúdos já tinham ido para a escola quando parou um carro à frente da minha casa e de lá saiu a senhora do Spínola  . Eram oito da manhã. Disse-me secamente: ‘Houve um acidente’. Eu perguntei: ‘Estão feridos?’. E ela respondeu: ‘Não, morreram todos’

Para quem nunca passo por terras da Guiné, Angola ou Moçambique, nunca consiguerá perceber este pequeno texto.

Um grande abraço ao Caseiro, por me ter alertado para a saida desta reportagem.

A todos um grande abraço
Fialho